Bach e Victorino d’Almeida

Personalidade incontornável do meio musical e artístico português, António Victorino d’Almeida dispensa apresentações. A sua versatilidade profissional e intelectual como compositor, maestro, pianista, escritor e comunicador, permitiram a construção de uma carreira ímpar que merece amplamente uma homenagem por ocasião do seu 85.º aniversário. Do programa deste recital constam as suas três Bagatelas para violoncelo e piano, escritas em 1968, 2000 e 2001 e sem ligação histórica entre si, que se caracterizam sobretudo por uma linguagem vanguardista, mas descomprometida, onde o único ponto comum parece ser a abordagem de temas de cariz popular, desenvolvendo-os pelos trilhos da atonalidade com uma notável perspicácia e leveza. Ponto alto deste recital é certamente a estreia mundial de uma obra para violoncelo e piano encomendada pelo CCB ao compositor português para esta interpretação do violoncelista Bruno Borralhinho e do pianista Raúl Costa.

Lado a lado com António Victorino d’Almeida, outra homenagem, ao mestre dos mestres: Johann Sebastian Bach. Originalmente escritas para viola da gamba — embora se distingam claramente da tradição estilística deste instrumento na época, caracterizada pelo virtuosismo na ornamentação e na utilização de acordes —, as Sonatas BWV 1027-1029 foram fazendo parte do repertório essencial de vários instrumentos e, muito especialmente, do violoncelo, cuja amplitude sonora permite a interpretação inalterada do texto musical original. A estrutura contrapontística a três vozes é transversal às três sonatas, com o protagonismo a ser minuciosamente partilhado entre o violoncelo e as duas mãos do piano. Datadas de meados de 1720, foram presumivelmente dedicadas a Christian Ferdinand Abel, conhecido virtuoso da viola da gamba e amigo pessoal de Bach, para quem este poderá ter escrito também algumas das famosas Suites BWV 1007-1012.